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A ESPADA JAPONESA (I)
"I - Uma arte renascida
Há
cinquenta anos atrás, tudo indicava que a arte da
manufatura da espada japonesa estava há um passo da
extinção. Perdida a sua importância para o combate,
com a invenção da pólvora; proibida a sua fabricação
e uso no Japão, pelas tropas americanas de ocupação; e
desprezada pela sua inutilidade na modernização
capitalista, a espada curva japonesa parecia destinada ao
esquecimento.
Sob a ocupação americana, ao fim da Segunda Guerra
Mundial, os japoneses foram proibidos de fabricar e
portar armas. As espadas existentes foram levadas para a
América, como "souvenirs" de guerra. Somente
após 1953, com a retirada das tropas de ocupação, a
proibição da manufatura de espadas foi suspensa. Com a
volta dos mestres sobreviventes e o surgimento de uma
nova geração de aprendizes, a arte ressurgiu das cinzas
e hoje é uma das manifestações culturais mais
importantes do Japão. O mundo dos fabricantes de espadas
é espantosamente conservador : os estudantes ainda têm
de cumprir um longo aprendizado com um mestre forjador,
vivendo com ele e aprendendo, passo a passo, as técnicas
secretas da fabricação, até serem considerados capazes
de produzir as suas próprias espadas. O governo japonês
exerce um controle férreo sobre o fabrico de espadas e
leis, ainda em vigor, determinam que :
a) apenas um armeiro licenciado pode fabricar um espada
japonesa. Esta licença somente pode ser obtida através
de aprendizado com outro mestre armeiro licenciado, por
um período mínimo de 5(cinco) anos;
b) um armeiro licenciado pode produzir apenas 2(duas)
espadas longas ou 3(três) espadas curtas por mês; e
c) todas as espadas tem que ser registradas pelo governo.
A organização que controla o estudo, a fabricação, a
promoção e a preservação das espadas japonesas é a
NIHON BIJUTSU TOKEN HOZON KYOKAI(NBTHK), a Sociedade para
a Preservação das Espadas Artísticas Japonesas,
fundada em 1960 e sediada em Tóquio. Esta organização
controla a produção do aço, a partir do minério de
ferro e organiza concursos para escolher os melhores
forjadores, polidores e fabricantes de bainhas e
ornamentos. Cada armeiro pode apresentar apenas uma
espada, a qual será examinada por um grupo de 15
especialistas. A nota final é o resultado de dois
exames. Armeiros que ganham repetidamente são aclamados
como MUKANZA e considerados "Tesouros
Nacionais".
II - IMPORTÂNCIA DA ESPADA NA CULTURA JAPONESA
A espada é um dos primeiros símbolos na história do
Japão. Junto com a jóia e o espelho foi um dos três
tesouros imperiais, ofertados pela Deusa do Sol ao seu
neto, de forma a lhe transmitir o direito e a autoridade
para governar. Posteriormente, a espada veio a
representar a atitude do Samurai, frente à vida e à
ação. A perícia no uso da espada se fundamentava, não
somente na força física, como na coordenação perfeita
entre a mente e o corpo e na habilidade em evitar golpes
de surpresa. O samurai dependia das virtudes da extrema
calma e da decisão. O seu espírito deveria fluir, sem
obstáculos, até a ponta da sua Katana. Ele não deveria
ser precipitado, mas não deveria, por outro lado, temer
a morte ou a dor. Desta forma, a sua técnica de esgrima
era um espelho que refletia o seu desenvolvimento
espiritual.
Acreditava-se que a espada absorvia as energias
circulantes ao seu redor, desde a sua fabricação e
continha parte do espírito do seu dono, através das
gerações. O seu dono, aliás, era apenas o seu
guardião, tendo a obrigação de mantê-la perfeita,
para o uso das gerações futuras. O grande número de
espadas antigas, em excelente estado de conservação,
existentes no Japão de hoje, são uma prova do respeito
que os japoneses mantem pelas suas espadas. Toda uma aura
mística cercava a sua fabricação e uso. Há histórias
de espadas que defendiam o seu mestre adormecido do
ataque de inimigos ou que se recusavam a ferir um
adversário de coração puro. Os ferreiros e espadachins
aprendiam as suas artes com espíritos chamados
"TENGU"(espécie de demônios híbridos) e
dizia-se que, muitas vezes, os Samurai misturavam um
pouco do seu sangue com ferro fundido, de forma a que
parte da sua essência espiritual fosse incorporada à
espada em processo de fabricação. A etiqueta (Reishiki)
da espada é muito rígida no Japão e determina como ela
deve ser manejada; como deve ser passada, de uma pessoa
para outra; qual o ângulo sob o qual ela deve ser
examinada; para onde a lâmina pode ou não ser apontada;
e uma infinidade de outras regras. Curiosamente, tais
regras são muito semelhantes às existentes no Velho
Oeste americano e pelos mesmos motivos : em ambos os
casos, trata-se de instrumentos dotados de um poder
destrutivo e letal.
(C o n t i n u a )
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